Chega. Circularidade não é a métrica que nos salvará da poluição plástica. Temos uma opção melhor.
10/04/2023
Pragmaticamente falando, plástico em aterro sanitário não causa impacto ambiental significativo. Nossos filhos e netos poderiam continuar aterrando plásticos… e o mundo continuaria o mesmo. Plástico em aterros não é poluição plástica. Em alguns casos, como o do polietileno produzido à base de cana-de-açúcar, plástico em aterros pode ser uma das formas mais econômicas e escaláveis de sequestrar carbono atmosférico.
Do outro lado, a poluição plástica – composta por aquele plástico que escapa da coleta – traz sim impactos ambientais significativos. Num prazo relativamente curto, a poluição plástica pode afetar o oceano e, por consequência, o mundo como conhecemos.
Em outras palavras: plásticos no meio ambiente (especialmente no oceano) pode nos sufocar muito – MUITO – mais rápido que plástico em aterros.
É uma questão de prioridade:
1ro, urgente, impedir que plásticos persistentes entrem e acumulem no oceano (e em outras partes do ambiente). A forma mais eficiente de combater a poluição plástica é melhorar a infraestrutura de coleta e disposição de resíduos. Um quilo de plástico que deixa de ir para o ambiente e vai para o aterro é uma grande vitória, pois estanca o sangramento;
2do, menos urgente, mas ainda importante, é garantir que plásticos pós-consumo encontrem seu uso mais ambientalmente eficiente (reciclagem mecânica para alguns materiais, reciclagem avançada para combustível/químicos/plásticos para outros ou, até mesmo, o uso de plásticos pós-consumo baseado em plantas em aplicações duráveis tendo o objetivo de sequestro de carbono, como, por exemplo, aditivo para asfalto)
A obsessão de Circularidade como “a” métrica é problemática, pois não prioriza a redução da poluição plástica, por exemplo:
– Um Real investido em CIRCULARIDADE, desviando plástico do aterro para a reciclagem, certamente aumentará a quantidade reciclada, mas não evitará em nada que a poluição plástica continue chegando no ambiente (porque plásticos que iriam para o aterro já não iriam para o meio ambiente);
– Um Real investido em REDUÇÃO DE POLUIÇÃO pode não aumentar a reciclagem, mas garante redução na quantidade de plástico chegando no meio ambiente. Esse seria o caso, por exemplo, da expansão da coleta de resíduos para novas áreas que – anteriormente – teriam seus plásticos não-coletados chegando no oceano.
A adoção de “circularidade” como a métrica principal relacionada à sustentabilidade de plásticos é um verdadeiro tiro no pé. Circularidade pouco pode reduzir o entendimento que plásticos são poluidores, pois plásticos continuarão a surgir em grandes quantidades nas praias ao redor do mundo.
Urgente. Precisamos mudar a métrica. Precisamos priorizar programas com base na REDUÇÃO DE POLUIÇÃO por Real investido.
Colocar a “Redução de Poluição” como principal métrica na priorização de projetos traz uma chance real salvar o oceano de danos permanentes. Seria um impulso importante para endereçar as falhas na infraestrutura de gestão de resíduos (viabilizando, portanto, a coleta e disposição em aterros sanitários dos plásticos que hoje – sem coleta – têm grande probabilidade de atingir o meio ambiente).
Desafiemos o consenso das métricas de circularidade. Seremos muito mais bem servidos por métricas de redução de poluição do que pela busca da reciclagem forçada enquanto ignorando a redução de poluição. Nossos filhos não ficariam incomodados por herdar aterros cheios de plásticos. Plásticos esses que, afinal de contas, não deixam de ser recursos a explorar. Mas nossos filhos ficariam revoltados com um oceano doente.
(Fonte: Ecopopuli, 04 de abril de 2023)
Eduardo
10/04/2023