E se o que sobra do feijão virasse uma embalagem?
07/12/2020
De olho no comportamento da sociedade, a Universidade de Passo Fundo (UPF), dentro dos seus vários cursos e programas de mestrado e doutorado, tem buscado oferecer novas experiências, ferramentas e produtos.
Foi com isso em mente que a doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Bioexperimentação (PPGBioexp) Lára Franco dos Santos pensou em desenvolver uma embalagem de hidrogel a base de amido de resíduo de feijão. Mas isso é possível? A ciência diz que sim e a pesquisadora explica.
Lára ressalta que a ideia surgiu a partir da necessidade de atender as exigências dos consumidores que, cada vez mais, têm optado por alimentos frescos, saudáveis, livres de aditivos sintéticos e, preferencialmente, já embalados. Em virtude disso, a demanda por embalagens à base de plásticos aumentou, consequentemente elevando a produção de resíduos e do descarte inadequado, causando ainda mais impactos no meio ambiente.
De acordo com ela, em todo o mundo, são geradas toneladas de resíduos provenientes de atividades agroindustriais e o destino que é dado para estes resíduos não é adequado. Para a doutoranda, estes materiais são fontes favoráveis de compostos de alto valor agregado e possuem diferentes ações biológicas, como antioxidantes e anti-inflamatórios. E é aí que entra a relevância do estudo, já que ele propõe, para além de refletir sobre essa realidade, uma possibilidade para substituição dos polímeros sintéticos pelos naturais, neste caso, provenientes do resíduo de feijão.
Nesse sentido, a pesquisadora pontua que fontes alternativas aos plásticos acabam surgindo como possibilidades para o desenvolvimento de embalagens para alimentos. A doutoranda explica que a utilização de polímeros naturais como polissacarídeos para a produção de embalagens é promissora, destacando-se o amido, por ser uma fonte atóxica, de baixo custo, não alergênica e considerado abundante. Aliado a isso, ela destaca que resíduos de agroindústrias como grãos quebradiços, bagaços de frutas e folhas de plantas são fontes para o desenvolvimento de novos produtos e/ou obtenção de compostos bioativos que podem ser incorporados como aditivos naturais.
A construção da embalagem
De acordo com Lára, o hidrogel (a embalagem) bioativo, a base de amido de resíduo feijão, incorporado com óleos essenciais e extratos de fontes alternativas com alta ação biológica, pode também ser um veículo para o controle de um importante patógeno de origem alimentar como a Listeria Monocytogenes (uma espécie de bactéria capaz de provocar doenças em seres humanos). Ou seja, além de contribuir para o meio ambiente, o material será uma fonte alternativa para controle desta bactéria, presente, por exemplo, em produtos cárneos.
O trabalho é desenvolvido nos laboratórios do Hospital Veterinário (FAMV) e de Bioquímica e Bioprocessos, do curso de Engenharia de Alimentos e Engenharia Química. Neste momento, o projeto está na fase de obtenção dos antimicrobianos naturais, com atividades para extração dos óleos essenciais e extratos vegetais, além da realização de testes com a bactéria Listeria.
“A ideia é chegar em uma embalagem, produzida através do hidrogel de amido, que é um material super absorvente, e pode ter a incorporação destes antimicrobianos naturais, estes materiais são fontes favoráveis de compostos de alto valor agregado e possuem diferentes ações biológicas, como antioxidantes e anti-inflamatórios”, conceitua Lára.
Após o término da fase de testes, Lára dará início a produção do hidrogel. “Seguiremos com testes de avaliação das propriedades mecânicas do amido para a produção do hidrogel e também como os antimicrobianos naturais se comportam no hidrogel. Após, pretendemos avaliar as interações do hidrogel, óleos essenciais e extratos com um produto cárneo. E claro, sempre avaliando todas essas variáveis para controle de Listeria”, observa.
Formar pesquisadores preocupados com os desafios da sociedade
O trabalho de Lára é orientado pela professora Dra. Luciana Ruschel, docente do PPGBioexp. Em sua opinião, as pesquisas têm acompanhado o ritmo da sociedade e isso é colocado em prática nos Programas da UPF.
“Temos uma grande preocupação em nossos programas de pós-graduação com a busca de produtos naturais na elaboração dos mais diversos alimentos, bem como o aproveitamento de matérias-primas que seriam descartadas em função da própria tecnologia de processamento, como é o caso do amido de feijão”, pondera.
Para Luciana, o projeto tem sua importância no sentido de buscar alternativas sustentáveis de aproveitamento de resíduos que normalmente seriam descartados.
“É uma oportunidade de estudar e otimizar estes resíduos transformando-os em algo novamente útil para a sociedade, com redução de custos de produção e ambientais”, pontua.
A orientadora frisa que todo esforço da pesquisa está voltado para que um novo produto seja criado. “Nosso esforço será neste sentido. Buscaremos testar as melhores formas de aproveitamento do amido de feijão para a elaboração de uma embalagem inteligente, que libere gradualmente compostos também naturais para controle de bactérias importantes em alimentos, aumentando assim o prazo de vida útil destes alimentos”, ressalta.
(Fonte: Diário da Manhã, 20 de novembro de 2020)